Um (só) serão

Ontem tive um serão diferente. Depois de jantar decidi, apesar do temporal que se fazia sentir em Lisboa, que não queria ficar em casa. Despedi-me com um beijo da minha mãe e da minha irmã, peguei num cachecol, num casaco e nas chaves de casa e saí. Sem chapéu-de-chuva. Detesto chapéus-de-chuva.

A cidade estava incrivelmente calma. Poucos carros na estrada, nenhumas pessoas na rua. Seria do temporal? Estaciono o carro, dou uma moeda ao arrumador e sigo para o cinema. "Um bilhete para XXXX, sff". A senhora, sem articular som, dá-me o bilhete. Desço as escadas. "Bolas, apetecia-me mesmo pipocas". Não há. Porém ao fundo, reluz uma máquina de chocolates. 1 euro, 1 pacote de malteseres. Está feito.

O filme era giro, mas nada de extraordinário. A minha frente um jovem casalinho que parecia coordenado com a acção do filme. Uma morte, um beijinho, uma explosão, outro beijinho. Deve haver um lado romântico na desgraça que desconheço. Os malteseres até estão a saber bem! Mas mastigo-os lentamente para não incomodar as pessoas. Nunca pensei que um simples chocolate se ouvisse em toda a sala. Acaba o filme, aperto o casaco ponho o cachecol ao pescoço e dirijo-me ao carro. Ainda lá estava, felizmente.

11h00? Ainda é cedo. Próxima paragem: King. Gosto deste cinema. Mais um bilhete. Desta vez, em vez de pipocas e malteseres dirijo-me ao café para tomar um. "Queria por favor... Espere! Deixe-me ver se tenho dinheiro trocado!. Tinha. Levanto os olhos e já tinha à minha frente o café, servido pela menina de chocolate com olhos tristes. Pago, recolho 2 ou 3 folhetos para ler e sento-me. Não havia uma única pessoa em todo o cinema a não ser os empregados e eu. Finjo ler o que tinha retirado, acabo o café e vou dar uma volta pelo cinema. Numa das cadeiras do corredor dorme um senhor. Mais tarde descobri que era o projeccionista que esperava pelo fim do filme da sala 1 e pelo inicio do "meu" na sala 2. Ao seu lado, com aquela postura característica das avós, uma senhora fazia um casaco de lá. Muito pequeno. Talvez para o seu neto.

É meia-noite. O casaco é deixado na cadeira, a senhora levanta-se para ir mostrar qual o meu lugar na sala vazia. Como se precisasse de ajuda. Descalço-me. Fecham as portas. O filme começa...

O filme acaba, e com ele também a noite. Chego a casa, reina o silêncio. Deito-me a pensar neste serão e chego a conclusão que por vezes sabe bem estarmos sozinhos, mesmo quando nos sentimos sós.

1 comentários:

  1. Violeta disse...

    Gostei do programa.  


 

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